quarta-feira, 26 de março de 2014

Quiosques trazem sabores novos ao Mercado de Fusão


Caril, tikka-massala, iogurte e mango-chutney? Pizzas rústicas de massa fina? Hotdogs com nomes caninos acompanhados por cocktails? Tudo isto e muito mais encontra-se nos três novos quiosques do Mercado de Fusão, que prometem trazer sabores novos e diversificados à praça do Martim Moniz.

Assim que saímos da estação de metro do Martim Moniz deparamo-nos com uma praça ao ar livre. Há dez tendas brancas alinhadas, onde se adivinham três novos espaços que abriram no início de Fevereiro e prometem trazer sabores novos à praça. O Bolo do Caco, o Pizza na Praça e o Dogtail são as novidades do Mercado de Fusão. Além dos típicos comes e bebes há outros projectos em curso que prometem dinamizar a Mouraria e o Martim Moniz. Já há novidades para o Verão. 

O Bolo do Caco a cargo de Cláudia Saraiva, com um percurso pautado pelo trabalho em restaurantes, foi o primeiro espaço a abrir. A marca original de Oeiras, que tem um restaurante sedeado no Monte Estoril, está também agora na praça do Martim Moniz. A hamburgueria Gourmet é considerada como um prolongamento do quiosque do Botequim do Moniz, da mesma proprietária, que se localiza na praça e contém especialidades brasileiras, como o prego de picanha e a salsicha toscana em bolo do caco. 

O que distingue estes hambúrgueres dos demais é o facto de serem servidos em bolo do caco, um bolo (pão) tradicional da Madeira. O Dragon Burger (8,50 euros) com caril, tikka-massala, iogurte e mango-chutney e o Sabóia Burger (12 euros), com molho bernaise, gambas, caviar (ovas de lumpo), carne de bovino (170g) e bolo do caco de alfarroba são as novidades da hamburgueria Gourmet

O que de melhor poderá acompanhar um hambúrguer? A limonada de frutos vermelhos (2 euros) e o chá gelado de especiarias e cremolato (copo a 2 euros e jarro a 7) um género de sangria, com vinho branco de pressão com sorvete destacam-se entre as bebidas mais pedidas.  

Pizza de massa fina
Ao lado está o Pizza na Praça (que substitui a Preta) e é de Gonçalo Gaioso. O gerente tirou uma formação em pizzas e criou a própria massa. Além da pizza romana Al Taglio, que significa corte, todos os dias servem-se pizzas rústicas de massa fina. “Temos a massa romana (de massa alta) vendida à fatia e a de massa fina (napolitana) de 5 a 7 euros. As pizzas romanas são a 1,80 euros, 2,20 euros e 2,50 euros”, explica o proprietário à FUGAS. Há ainda as panzerotti (1,50 euros), as empadas de massa recheadas com salame e requeijão, legumes e mozzarella ou presunto e gorgonzola. São as pessoas que escolhem os ingredientes. Para a sobremesa há as doces, de que é exemplo a pizza de chocolate. 

Mas não é só na massa das pizzas que reside o segredo do Pizza na Praça: também os azeites aromáticos, feitos à base de frutas para as complementar, primam pela diferença: há o de malaguetas verdes e vermelhas. Para acompanhar a refeição, os cocktails italianos, como o capitello, os negroni, o vodka-tini, o dry-martini e a sangria de labrusco (que inclui o tinto, o branco e o rosé) são as bebidas ideais.

Dos cocktails aos hambúrgueres de nomes caninos

O Dog Tail localiza-se em frente ao Pizza na Praça. Pertence a Luís Domingos e a Dave Palethorpe, donos do El Cartel, com quiosque também neste espaço. Os especialistas em cocktails quiseram criar um lugar para estas bebidas, acompanhado pelo melhor snack do mundo: os hotdogs

Este é um conceito inovador que agrega sabores internacionais e portugueses. Aqui combinam-se cocktails e hotdogs, todos eles com nomes caninos. Entre os mais pedidos está o Santa’s Little Helper (4,50 euros), o nome do cão dos Simpsons, com bacon estaladiço, coleslaw (salada de repolho) e mayonnaise. Há também as chapatas (aquecidas) com frango e atum, bem como os paninis. 

Entre os mais saboreados está o Benji (5 e a 6 euros) com nutella, mel e banana e o Brian Griffin, com tomate, mozarela e presto. A acompanhar estão os cocktails múltiplos e variados. Há o Gin Garden (5 euros) de gin, limão e tónica indiana e o Sherlock Bones, com cachaça, açaí e limão. Destaca-se, ainda, o Dartacão, com arando, limão, baunilha e frutos silvestres (3,50 euros) e o Julieta, com frutos silvestres, gelado de côco e leite (4 euros). 

“Gostamos de ter uma variedade que permita satisfazer todos os nossos clientes”, afirma Luís Domingos. Há clientes portugueses e estrangeiros: “80% são portugueses e 20% são estrangeiros. No inverno é ao contrário”, daí a diversidade da oferta nacional e internacional de que dispõe. “O conceito foi totalmente pensado e criado por nós”, explica o mentor do projecto à FUGAS. Pretende-se brincar com as pessoas, com a comida e com a bebida. Além dos comes e bebes há também espaço para o lazer: existe a beer-pong, “uma mesa de ping-pong onde se joga com imperiais”, acrescenta.

Há novos projectos para o Verão

Os quiosques na praça do Martim Moniz existem desde 9 de Junho de 2012. Renovar a zona, trazer um sangue novo à praça e combater os problemas étnicos que anteriormente existiam é o objectivo principal do Mercado de Fusão. Até agora os resultados têm sido positivos. O conceito gira em torno de dez quiosques de comida do mundo. Há cores e cheiros de diversos países e continentes: da China à Argentina, do Japão ao Brasil passando por África e Bangladesh, todos são convidados a fazer uma viagem gastronómica multi-cultural.

Além dos quiosques, neste momento há alguns projectos em curso para renovar a Mouraria e o Martim Moniz e, como explica Ana Nobre, do Gabinete de Comunicação do Mercado de Fusão na praça, “quisemos fazer parte desta renovação, com o Mercado de Fusão”. 

Os primeiros sábados de cada mês dão lugar a outras actividades dinamizadas pelo Lx Market, responsável pela organização da feira das 11h às 18h. “Além da restauração, temos também a feira do Mercado de Fusão, mais direccionada para o artesanato: comercializam-se produtos vintage, em segunda mão e peças de autor”, afirma.

Já há novidades para o Verão. Ana Nobre desvenda um pouco do que se vai fazer na praça: “vai haver um open air cinema, a transmissão de todos os jogos da selecção ao ar livre e Out Jazz promovida pela concessionária Número de Ciclo por segundo (NCS)”.

sexta-feira, 21 de março de 2014

O brigadeiro é a nova pequena grande delícia do Príncipe Real

Fonte:  http://fugas.publico.pt/restaurantesebares/332202_brigaderia-petit-delice

São doces, são salgados, são bem acompanhados. A Petit Delice apresenta-se como uma espécie de “mini-restaurante de sobremesas” e é a primeira brigaderia de Lisboa. E promete o verdadeiro brigadeiro brasileiro. 

Entrámos na pequena loja iluminada a meia-luz, por entre paredes com flores desenhadas e de fundo salmão, ao som de uma música vinda dos anos de 1930 e sentindo um cheiro a rosas no ar. Para lá dos sofás esverdeados e mobiliário e outros toques vintage, está a atracção principal desta “pequena delícia”: os brigadeiros.

Aliás, a Petit Delice, recém-aberta no Príncipe Real, é até o primeiro espaço dedicado de alma e coração aos brigadeiros em Lisboa. A cargo do casal Isabela Barros e Adriano Braga, a brigaderia traz sabores brasileiros e promete doces e salgados confeccionados no momento.

“Queremos que as pessoas aguardem uns minutos para que possamos preparar o brigadeiro fresco e o comam na hora ou o levem para casa.” Quem o diz é Isabela Barros, assistente social que deixou Porto Alegre, capital do estado de Rio Grande do Sul no Brasil, para se entregar a uma paixão de sempre: fazer brigadeiros. “Pretendemos que as pessoas comam um produto fresco feito na hora, como se fosse um mini-restaurante de sobremesas, e que disfrutem um pouco do espaço, que é tranquilo”.

A ideia de vir para Portugal surgiu há um ano quando Isabela decidiu fazer um doutoramento. No entanto, a paixão pelos brigadeiros não foi esquecida e decidiu fazer uma pausa nos estudos para, juntamente com o marido, pôr as mãos na massa. O companheiro, com experiência de atendimento ao público, e Isabela, com experiência de cozinha, abriram então a Petit Delice.

“O que nos incentivou, para além da paixão que temos pelo doce, foi ver que estamos a oferecer um produto diferenciado ao cliente”, afirma a proprietária. O que mais se encontra nos quiosques e nos cafés são brigadeiros que não o são bem e que não têm nem um sabor nem uma textura como a que existe no Brasil”, garante. 
 
Dos doces lusos aos salgados brasileiros

Comecemos pelo apetitivo: o brigadeiro salgado. “Resultam de uma ideia desenvolvida por nós para agradar às pessoas que gostam de comer um salgado antes de partir para um doce. Tem uma base de massa tenra e o recheio é à base de queijo e de frutos secos”.

Pela ementa, encontram-se do brigadeiro de mozzarela e tomates secos ao de camembert e geleia de alperce, passando pelo de gorgonzola e cebola, pelo de hummus (a pasta de grão-de-bico condimentada, característica da cozinha do Médio Oriente) ou o de brie e nozes.

Depois de um salgadinho vai um doce? Entre os mais pedidos estão o Tradicional (de chocolate de leite) mas existem outras variedades, incluindo o 70% Cacau, o Beijinho, Prestígio (com coco), o Paçoca (uma mistura de brigadeiro e doce de amendoim, paçoquinha), o Amêndoas Laminadas, o Ameixa, o Café, a Caipirinha, o Ananás, o Caju, o Bolacha, o Ovomaltine, o Rum e Cacau, o Nutella e o Goiabada e Queijo.

Comem-se à dentada ou à colher - quando a massa vem dentro de um frasquinho de 40g (4 euros), de um tachinho de 100g (10 euros) - e à fatia de tarte (3 euros).

A acompanhar a escolha doce ou salgada do freguês, sugerem-se chá ou café, um Porto, um espumante ou champanhe. Ou então essa outra especialidade - que não podia faltar em casa brasileira: uma caipirinha.

“A nossa grande preocupação é usar sempre ingredientes que não contenham aditivos químicos e que sejam mais frescos”, explica Isabela, sublinhando que evitam utilizar confeitos muito açucarados e coloridos para que o doce não se altere e preserve as suas características. Ao mesmo tempo querem usar ingredientes que possam deixar o doce bonito e saboroso.

Entre experiências, já passaram de uma dezena de sabores iniciais para cerca do dobro. “Todas as semanas temos feito testes. A ideia da brigaderia não foi a de inaugurar um menu fechado”, garante a proprietária.

Casa pequena, planos grandes

O nome da loja/”mini-restaurante de sobremesas” parece aludir não só ao tamanho da pequena grande delícia que serve como também à real dimensão da casa. Pode receber em simultâneo uma dezena de pessoas no máximo, “para que possam estar bem acomodadas e sejam bem servidas”. Um grupo que queira reservar todo o espaço pode mesmo fazê-lo, seja para reuniões de negócios, convívios ou comemorações.

Apesar de estar localizada num sítio mais ou menos recatado, a acessibilidade facilitada ao jardim do Príncipe Real faz com que esta seja a porta de entrada de várias pessoas. “Aos poucos estamos a consolidar um público que gosta de doces, que gosta de experimentar coisas novas, como é a proposta dos brigadeiros salgados”, diz Isabela. A ideia é que as pessoas vão ao local, experimentem e passem a palavra aos amigos.

Para continuar a cativar e surpreender, prometem-se novidades. Com a aproximação do Verão, o horário poderá prolongar-se pela noite (até às 22h) e acabam de estrear a nova especialidade da casa, a caipirinha. Além disso, querem continuar a inovar e a trazer um novo fôlego ao mundo dos doces. Por aqui, haverá sempre mais um brigadeiro para descobrir.

terça-feira, 11 de março de 2014

Autoridades reforçam controlo de tráfico ilegal de animais nos aeroportos

Fonte: http://www.publico.pt/sociedade/noticia/autoridades-reforcam-controlo-de-trafico-ilegal-de-animais-nos-aeroportos-1627896

Países da América Latina e de África são principais pontos de origem de passageiros que transportam espécimes protegidos, cujo comércio internacional é ilegal.

Aeroporto de Lisboa, 6h20: os passageiros do voo TAP058, vindo de Brasília, capital do Brasil, aguardam pela bagagem junto ao tapete rolante. Enquanto as malas vão chegando, os cães da GNR farejam os turistas. Com o faro, procuram indícios da presença de espécies protegidas ou de material feito a partir delas, cujo tráfico é ilegal. Desta vez, nada lhes chama a atenção.
 
A fiscalização, realizada nesta terça-feira, é uma das duas que o Instituto de Conservação de Natureza e Florestas (ICNF), com o apoio da GNR e do Ministério Público, passará a fazer todos os meses nos aeroportos de Lisboa e do Porto. O objectivo é travar o tráfico de espécies em vias de extinção abrangidas pela Convenção sobre o Comércio Internacional de Espécies de Fauna e da Flora Selvagem Ameaçadas de Extinção (Cites), que Portugal assinou em 1983.

Os países de África e da América do Sul (como o Brasil) são os principais pontos de origem destes espécimes – que podem ser animais vivos, como cobras e tartarugas, ou materiais como carteiras em pele de crocodilo ou estatuetas de marfim de elefante africano, por exemplo. Nos últimos dez anos, o número de apreensões tem oscilado. Depois de, em 2003, terem sido apreendidas 577 peças, em 2011 houve novo pico: 556 peças interceptadas, mais do que o dobro de 2006, por exemplo.
 
A atenção dos fiscais está cada vez mais voltada para os ovos de papagaio, que se tornaram a mina de ouro dos traficantes nos últimos anos. Só em 2012, segundo dados do Ministério do Ambiente, foram apreendidos 351 ovos. As primeiras apreensões de papagaios e araras ocorreram em 2001. “Para não fazerem barulho, as aves vinham enfiadas em panos e em papel molhado, portanto tinham uma elevada taxa de mortalidade, de mais de 95%”, explica João Loureiro, chefe da Divisão de Gestão de Espécies de Flora e Fauna do ICNF.
 
Com o cerco a apertar, os traficantes foram aperfeiçoando a técnica. Agora, em vez de aves adultas, transportam as espécies na forma de ovo, em cintos atados à cintura. “A temperatura de incubação dos ovos é a mesma do corpo, portanto basta um cinto à cintura para transportar os ovos e não interromper o seu desenvolvimento”, explica o secretário de Estado do Ordenamento do Território e Conservação da Natureza, Miguel de Castro Neto, que assistiu à operação.

“Algumas aves nascem-nos nas mãos”, conta Loureiro. Só no ano passado foram efectuadas sete apreensões de ovos de aves, de elevado valor. “O valor das espécies mais raras, como a arara-azul, pode ir até aos 400 mil euros”, exemplifica Miguel de Castro Neto.
 
O reforço da fiscalização nos aeroportos visa também sensibilizar a sociedade para a não-aquisição dos espécimes. “O grande desafio é nós fazermos compreender à sociedade que não deve dar valor a estes animais, porque, se o fizer, está a ser parceira neste tipo de crime”, diz Miguel de Castro Neto, frisando que os animais abrangidos pela CITES, muitos em risco de extinção, devem ser valorizados no seu habitat natural. Já na sexta-feira o ICNF incinerou cerca de 3000 artigos, uma tonelada, apreendidos entre 1983 e 2002, para "retirar valor" às peças.
 
Este tipo de crime, ao contrário do tráfico de droga, por exemplo, que tem molduras penais mais pesadas, acaba por compensar. “As redes de tráfico aproveitam o facto de ter menos notoriedade e menos conotação negativa, o que faz com que os sistemas penais tenham para com este tipo de tráfico uma complacência que não têm para outros”, afirma, por seu lado, o secretário de Estado da Administração Interna, João Almeida, que também acompanhou a operação.

O pastor-alemão preto, Joni, e o pastor-belga malinois, Edmond, são os agentes caninos de serviço. Fazem parte das equipas cinotécnicas (militares e cães) que são treinadas durante um ano para detectarem odores de aves tropicais (sobretudo a arara e o papagaio), de primatas, de tartarugas e de peles de cobra.
 
O voo de Brasília vinha limpo. Perto das 7h, chegam os passageiros vindos de Miami, EUA. Assim que saem, deparam-se com surpresa com os cães que as revistam. As crianças não são submetidas a este processo. Mais uma vez, os animais não encontram nada.

sábado, 8 de março de 2014

Memórias do sismo de 1980 nos Açores reunidas num site

Fonte:  http://www.publico.pt/ciencia/noticia/memorias-do-sismo-de-1980-nos-acores-reunidas-num-site-1627466

Milhares de fotografias, centenas de documentos e dezenas de testemunhos do terramoto compilados por quatro estudantes universitários.

Ouçamos a voz de Maria João Borges, hoje com 60 anos, uma das sobreviventes do terramoto nos Açores a 1 de Janeiro de 1980: “Consigo ouvir o barulho que fez, parecia um avião a cair. Quando cheguei à porta da minha casa, vi o orfanato a desabar. Na altura, já estava casada e morava no desterro onde abaixo da
minha casa morreram cinco pessoas da mesma família. Na minha habitação, a parede da frente separou-se das outras.”
 
O testemunho de Maria João Borges, que na altura do sismo ainda estava na casa dos 20 anos de idade, é um dos vários que se encontram num site destinado a preservar a memória do sismo de 1980 nos Açores. Quatro estudantes da Universidade de Aveiro, todos açorianos, todos da ilha Terceira, todos nascidos depois de 1980, tiveram a ideia de avançar com um projecto multimédia que criasse um repositório público de informação para manter viva a memória do sismo que matou 73 pessoas, fez 400 feridos e deixou mais de 21 mil desalojados e 12.000 estruturas danificadas.

O sismo ocorreu às 15h42 (hora local), teve uma magnitude de 7,2 graus e o epicentro foi no mar, a cerca de 35 quilómetros a su-sudoeste de Angra do Heroísmo. Na ilha Terceira, a mais atingida, causou a destruição de 80% dos edifícios na cidade de Angra do Heroísmo, assim como elevados danos na vila de São Sebastião e nas freguesias do Oeste e Noroeste da ilha, especialmente em Doze Ribeiras. Outras ilhas afectadas foram Graciosa e São Jorge.
 
Nas ilhas açorianas, este tremor de terra é conhecido apenas como Sismo d’Oitenta, designação escolhida também para o projecto multimédia de João Aguiar, Luís Silva, Luís Melo e Rubén Quadros Ramos, apresentado em Janeiro em Angra do Heroísmo. Tinham-se completado 34 anos desde o sismo. Apesar de terem tido a ideia há três anos, altura em que os quatro estudantes universitários começaram a recolher informações sobre o sismo, só em 2013 é que puderam dar-lhe forma. Milhares de fotografias, centenas de documentos e dezenas de testemunhos foram então reunidos nos últimos dois anos, diz ao PÚBLICO João Aguiar, actualmente estudante do 2º ano da licenciatura de Novas Tecnologias da Comunicação na Universidade de Aveiro.

“Houve muitos valores que se apreenderam com o sismo, inúmeras histórias de heroísmo e sobrevivência, de dor e de pranto que não tiveram hipótese de ser registadas, porque havia feridos para tratar, mortos para enterrar e casas para reconstruir”, refere ainda João Aguiar, num comunicado da Universidade de Aveiro.
 
Através do site, os quatro estudantes pretendem chegar às pessoas que “sentiram a terra tremer”, aos que viram os “entes queridos falecer ou as suas casas ruir”, aos que “eram emigrantes e passaram semanas sem saber nada dos seus familiares”, ou até mesmo os que “vieram do outro lado do mundo para trabalhar na reconstrução das ilhas”, diz-nos outro dos mentores do projecto, Rúben Ramos, actualmente estudante de mestrado de Comunicação Multimédia na Universidade de Aveiro.

Não foi fácil chegar até aos “autores das fotografias, para lhes dar o crédito devido, e a informação dos vários documentos foi difícil de compilar”, explica ainda João Aguiar. Estes dados foram disponibilizados pela Direcção Regional das Obras Públicas, Tecnologia e Comunicações (onde se encontra todo o espólio do Gabinete de Apoio à Reconstrução, criado logo após o sismo), bem como pelo Instituto Açoriano da Cultura e por muitas pessoas. “A onda de informação que nos chegou e que ainda nos chega hoje é completamente extraordinária.”

“Nunca mais fui capaz de comer torta de cenoura”
 
No site encontram-se também fotografias sobrepostas: mostram como ruas, casas e outros edifícios ficaram depois do sismo e como agora os podemos encontrar. “É possível visualizar um resumo dos acontecimentos do sismo, observar uma comparação sobreposta entre fotografias da destruição e da actualidade, assistir a vídeos com pessoas ilustres a explicar as várias facetas da problemática, ler testemunhos de pessoas do dia-a-dia e partilhar a sua própria história”, refere Rúben Ramos. “É um projecto aberto e sem fins lucrativos, onde todos podem participar.”

As 40 a 50 pessoas com testemunhos no site, uns em vídeos e outros em texto, souberam do projecto através do Facebook, onde em 2011 começou a partilha de histórias e a recordação daqueles momentos difíceis. Outras conheceram o projecto através de amigos. Depois, algumas que viveram o sismo na pele foram entrevistadas pelos estudantes, por vezes nas suas casas.
 
Outro desses testemunhos é o de Avelina Cota. “A minha principal recordação é o barulho ensurdecedor, parecia um trovão que não parava de ressoar. Nem me apercebi do tremor da terra, vi mais do que senti, era como ver as imagens em câmara lenta e através de fumo.” Conta ainda que estava em casa de uma prima que tinha feito torta de cenoura, quando tudo começou. “Quando ia cortar a torta, ouviu-se aquele ruído aterrador e corremos para a rua, desci as escadas, saltei o muro para a rua de minha casa e sempre a tremer, a ribombar... Foi horrível.”

Uns dias depois do sismo, o pai de Avelina Cota decidiu dar a volta à ilha para ver os estragos. “Não conseguimos chegar ao fim, era demasiado penoso, principalmente quando avistamos as Doze Ribeiras do alto e só vimos pedras pretas. É uma visão que ainda recordo.” Desde então, duas coisas ficaram para sempre associadas uma à outra na memória de Avelina Cota. “Nunca mais fui capaz de comer torta de cenoura, lembro-me sempre do terramoto.”
 
O projecto não terminou nem a ideia é essa. O objectivo é continuar a reunir mais testemunhos e mais informação, para que o site seja um registo da história e da memória das ilhas açorianas e tenha também utilidade científica.


quarta-feira, 5 de março de 2014

Portugal vai ter bolsa de casas para vítimas de violência doméstica

Fonte: http://www.publico.pt/sociedade/noticia/bolsa-de-casas-para-vitimas-de-violencia-domestica-em-operacionalizacao-1627107

O Instituto da Habitação e Reabilitação Urbana (IHRU) vai criar uma bolsa de casas para vítimas de violência doméstica, para garantir o seu alojamento depois da saída das casas de abrigo.

A medida vai ser implementada no âmbito do quinto Plano Nacional de Prevenção e Combate à Violência Doméstica e de Género, para os anos 2014-2017. Por enquanto, não há data prevista para a abertura de portas destas casas.
 
O objectivo do protocolo entre o Instituto da Habitação e Reabilitação Urbana (IHRU) e a Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género (CIG) é responder às dificuldades que as vítimas com poucos recursos financeiros têm em custear o seu próprio alojamento, sendo que “é o momento da saída da casa de abrigo que maior dificuldade coloca".
 
Neste momento, “o que temos é um mercado livre de habitação, a preços que muitas vezes as mulheres não podem suportar, e, por outro lado, por via judicial, o requerer de acções de casas de família que são muitas vezes acções longas e morosas, e que não protegem as vítimas para que estas regressem às zonas de origem”, constata a directora executiva para a violência de Género da União de Mulheres Alternativa e Resposta (UMAR), Elisabete Brasil.

Reiterado no texto do protocolo o objectivo de dar "resposta às necessidades de habitação condigna das vítimas de violência doméstica”, a CIG não dispõe, porém, de informação quanto ao número de vagas ocupadas nas casas abrigo. Quanto à taxa de ocupação, “ronda os 99%", entre “vítimas de violência doméstica e filhos/as menores, que com elas se encontram”, lê-se na resposta enviada ao PÚBLICO.
 
A permanência das vítimas nesta recém-criada bolsa de casas "não deve ser superior a seis meses”, dado tratar-se de uma resposta temporária, que faz a transição entre o acolhimento temporário das casas de abrigo e a integração na vida em comunidade. São 25 os municípios abrangidos pelo programa.
 
As habitações são “propriedade do IHRU", refere o protocolo assinado em Dezembro. No que se refere ao valor das rendas, este será “calculado de acordo com o regime de renda apoiada e varia consoante o rendimento e composição do agregado familiar”. Quanto ao número de fogos, este irá depender do número de pedidos e da localização, segundo fonte do IHRU, em declarações à agência Lusa.

Elisabete Brasil apoia a iniciativa que, acrescenta, só peca por não ter sido implementada mais cedo. “Estamos a falar de pessoas que deixam tudo: os seus trabalhos, as suas redes familiares, os seus contextos de origem e de vivências que conhecem, para serem colocadas noutros pontos do país e recomeçarem as suas vidas”, sustenta, para sublinhar ainda que o sistema deve encontrar mais soluções que protejam a vítima e não o agressor. “Se o sistema não cumpre o que é punir o agressor e decidir esta protecção que possibilite a manutenção das vítimas no seu local de origem, é ele próprio que tem que encontrar medidas alternativas de apoio a uma estratégia que não levou a cabo”, defende.
 
A criação de condições para estas vítimas no momento da saída das casas de abrigo, já tinha estado na origem de um outro protocolo de cooperação, celebrado em Agosto de 2012, entre a Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade, o Secretário de Estado da Administração Local e Reforma Administrativa e a Associação Nacional de Municípios Portugueses, com o objectivo prestar apoio por parte dos 25 municípios aderentes ao processo de autonomização das Vítimas de Violência Doméstica e de Género, no momento da saída das casas-abrigo”, adiantou fonte da CIG ao PÚBLICO.
 
Violência doméstica traduzida em números

Em 2013 a APAV registou 20.642 crimes, um número ligeiramente superior aos 20.331 crimes registados em 2012. No que respeita à tipologia, a violência doméstica representa a esmagadora maioria (84,2%) dos crimes relatados pelas vítimas. E, dentro desta categoria, a APAV destaca a percentagem significativa de
maus-tratos psíquicos (36,8%) e físicos (26,9%). Ambos perfazem 63,7% dos “crimes de violência doméstica em sentido estrito”.
 
Até ao dia 20 de Novembro de 2013, o Observatório de Mulheres Assassinadas da UMAR contou, por seu turno, 33 mulheres assassinadas pelos seus companheiros ou ex-companheiros. No ano anterior, tinha havido 40 homicídios, menos sete que no ano precedente, e 53 tentativas de homicídio, num total de 93 crimes.
 
No relatório do OMA, a UMAR defende ainda a necessidade de aplicação de instrumentos de avaliação de risco e a promoção de medidas de coacção adequadas e em tempo útil. Sugere ainda que seja potenciada a monitorização das medidas de coacção aplicadas e que se promova a vigilância electrónica destas, bem como um aumento das medidas de fiscalização preventiva contra a posse ilícita de armas e desenvolvidas estratégias que penalizem os agressores.