Assistente social na Ilha há 17 anos e com uma vida dedicada às pessoas, Maria Eduarda Duarte tem 44 anos e já trabalhou em algumas zonas do país, como Alentejo ou Porto de Mós. Natural de Chão de Couce, é licenciada em Serviço Social pela Universidade Miguel Torga, em Coimbra. Ao RodIlha falou sobre a importância da actividade e os desafios que enfrenta no dia-a-dia.
RodIlha: Apesar de residir em Pombal, é à Ilha que tem dedicado o seu trabalho. A que mudanças tem assistido desde há 17 anos até aos dias de hoje, na localidade onde labora?
Maria Eduarda Duarte (MED): A sociedade em geral está em mudança. O conceito de família tradicional já não é o mesmo, com o desemprego e a emigração assistimos a um maior número de famílias monoparentais. O envelhecimento da população cresce a passos largos, não só porque são os mais jovens a emigrar, mas também devido à redução da taxa de natalidade. Os filhos saem cada vez mais tarde da casa dos pais, têm filhos mais tarde e apenas têm um ou dois. Também o aumento da esperança média de vida está a aumentar contribuindo para a total inversão da pirâmide de idades. A humanidade enfrenta o maior envelhecimento da história. Passámos de muitos netos e poucos avós para muitos avós e poucos netos. Por outro lado, vivemos numa sociedade marcada pelo medo, pelo individualismo, e estes factores desencadeiam insegurança, ansiedade e depressão.
RodIlha: Quais são os principais desafios com que se depara, actualmente, ao nível do serviço social?
MED: Numa sociedade em profunda mutação, onde as regras e valores já não possuem a mesma rigidez de há uns anos, será um dos principais desafios do serviço social na transição em que se encontram as sociedades actuais, o de contribuir como uma alternativa, em termos de visão teórica e prática interventiva, pautada por princípios éticos e por um olhar responsável sobre o mundo, cruzando várias vertentes, sem esquecer a singularidade individual. Outro grande desafio será no domínio das políticas sociais, dado que as respostas têm de ser cada vez mais diversificadas e o trabalho a realizar tem que ser executado e reflectido de um ponto de vista multidisciplinar. Também perante a realidade do envelhecimento das populações, as sociedades deparam-se com o problema de não saberem o que fazer aos que atingem idades avançadas, com tudo o que isso implica, aumento do número de pensionistas, evolução das incapacidades, doenças crónicas e doenças fortemente incapacitantes, as doenças degenerativas. As implicações do envelhecimento por si só representam um dos desafios mais importantes deste século e, nomeadamente, do serviço social.
RodIlha: Neste momento trabalha em que instituição? Com que faixas-etárias?
MED: Em 1998 quando conclui a Licenciatura tive conhecimento de uma vaga para Assistente Social nesta instituição e concorri, contudo, não cheguei a tempo. A vaga tinha sido preenchida no dia anterior. Nesta altura eu já tinha colocação no Alentejo e foi lá que iniciei a minha prática profissional. Um ano depois a Direcção do Centro Social contactou-me para saber se tinha disponibilidade para vir trabalhar na Ilha. Aceitei de imediato. Quando cheguei em Março de 1999 esta instituição desenvolvia o apoio à população idosa na freguesia da Ilha, Guia, Mata Mourisca, Carriço e Carnide, através de duas respostas sociais: Centro de Convívio e Serviço de Apoio Domiciliário. Devido ao empreendedorismo e empenho na acção social por parte da Direcção da instituição, ainda no mesmo ano passamos a ter Centro de Dia e Centro de Actividades de tempos Livres que incluíam as férias na praia no mês de Julho. Esta actividade ainda hoje se mantém estando aberta a todas as crianças da comunidade. Em 2002 foram abertas as novas instalações do Centro Social, construídas de raiz e a abertura da Creche. Em 2012 esta instituição abriu portas a uma Estrutura Residencial Para Pessoas Idosas. A minha prática profissional é hoje mais abrangente pelo aumento de respostas que a instituição integra.
RodIlha: O serviço social é uma escolha ou uma vocação?
MED: Sem dúvida uma vocação. O meu pai gostaria que eu fosse enfermeira, mas não me sentia vocacionada e por mais que tentasse enganar os testes psicotécnicos, eles recaiam sempre na área social. Também cheguei a pensar ir para o ensino, mas tive uma professora de história que me desencaminhou.
RodIlha: O serviço social é fulcral na vida das pessoas. Quais são os principais desafios e obstáculos com que se depara um assistente social actualmente?
MED: O Serviço Social é uma disciplina científica no âmbito das ciências sociais que tem como objectivo estudar e agir com vista à diminuição das condições de desigualdade, promovendo a justiça social e a cidadania. Por outro lado, o Assistente Social é um profissional especializado na área das ciências sociais e humanas que recorre a procedimentos específicos e age com o propósito de identificar e resolver os problemas dos indivíduos e da comunidade. Perante a sociedade contemporânea, pensar o serviço social é sobretudo pensar as condições e os pressupostos inerentes à sua readequação e pertinência a esta sociedade. O compromisso com a mudança, no sentido do desenvolvimento e da justiça social, e a abertura à inovação constituem o ponto central de um serviço social capaz de se afirmar como elemento estratégico na construção de sociedades alternativas, sócio-economicamente justas e equilibradas. Os recursos são cada vez mais escassos e as necessidades cada vez maiores.
RodIlha: Na sua opinião, que características deve reunir um bom assistente social, para que responda positivamente às tarefas a que se propõe?
MED: Um Técnico de Serviço Social deve ter sensibilidade social, deve ter convicção e confiança nas pessoas e nas suas capacidades de realização e resolução de problemas, o assistente social deve ter capacidade para a motivação e estimulo. Por outro lado, é um profissional que deve ter aptidão para o relacionamento humano, na medida em que vai trabalhar com pessoas, deve possuir maturidade humana, distanciamento, pragmatismo e criatividade, capacidade de avaliação e estratégia.
RodIlha: Se pudesse, o que mudaria hoje na sua profissão?
MED: Muita Coisa. As origens do serviço social têm por base princípios humanitários e democráticos. As principais preocupações centram-se na satisfação das necessidades humanas e tem como principal objectivo provocar mudanças sociais e trabalhar para potenciar o bem-estar e a realização pessoal dos indivíduos, tendo como pano de fundo a justiça social. Contudo, a profissão terá passado alguns períodos conturbados, nomeadamente pelas conjunturas sociais e pelas mentalidades um pouco deturpadas, uma vez que o serviço social foi durante muitos anos confundido com o assistencialismo. A formação, a evolução e a afirmação do ensino da profissão, com licenciatura e mais tarde o doutoramento, têm contribuído para uma melhor especialização e profissionalização dos assistentes sociais. Há sempre alguma coisa a mudar.