"Sejam realmente bons profissionalmente mas nunca descurem os valores humanos"
Tem 24 anos mas já é notícia por ter sido aprovada com a melhor nota ao nível nacional no exame de estágio da Ordem dos Solicitadores e dos Agentes de Execução. Com 17 valores, a jovem solicitadora admite que, quando pensou em ingressar na universidade, Solicitadoria não foi a primeira opção. Marlene Santos fala sobre as metas já atingidas e os planos que tem para o futuro.
Ana Isabel Mendes (AIM) - Terminado o ensino secundário, concorreu ao superior. Qual foi a sua primeira opção? O que se imaginava a fazer na altura?
Marlene Santos (MS) - Sempre tive uma grande propensão para as nobres causas e, à medida que fui pensando naquilo que realmente gostava de exercer a nível profissional, decidi que teria de ser algo direccionado para essa vertente. Tinha feito voluntariado no Centro de Acolhimento Temporário de Crianças e também no Lar de Idosos Rainha Santa Isabel, da Santa Casa da Misericórdia de Pombal, e ambas as experiências me deram mais certezas de que seriam as áreas de Educação Social ou Serviço Social que pretendia seguir no ensino superior. Nessa sequência, a minha primeira opção foi Educação Social, a segunda Serviço Social e, só depois, Solicitadoria, tendo ficado logo excluídas as duas primeiras, dado que não tive vaga em 2ª fase.
AIM - A área social estava entre as suas opções. Já pensou, de alguma forma, conciliar os dois gostos que tem: a Solicitadoria e a Educação Social?
MS – Posso dizer que não estruturei essa conciliação. Acho, no fundo, que a minha vontade de ajudar o próximo pode ser feita através da minha profissão, como solicitadora, auxiliando os que pouco ou nada compreendem de leis, a ter acesso a elas e a exercerem os seus direitos. No entanto, sempre quis ir para os países subdesenvolvidos fazer voluntariado, nomeadamente dar aulas, e não deixo, de todo, essa hipótese de parte. Contudo, recordo sempre o que uma professora de ciências do nono ano me dizia: “não podemos mudar o mundo, mas podemos mudar o mundo de alguém” e, por isso, é bom tentarmos fazer essa diferença naqueles que vivem mais próximos de nós ou que nos procuram.
AIM - Quando soube o resultado da candidatura, como lidou com a entrada na licenciatura em Solicitadoria? Foi uma surpresa? Como se sentiu na altura?
MS – Confesso que mal. Chorei muito, bati o pé porque não queria ir para um curso que nem sequer sabia do que tratava. Foi uma noite emocionalmente difícil aquela em que soube os resultados das colocações. Não foi uma surpresa propriamente dita já que sabia que o número de vagas restantes para a 2ª fase das colocações, nas minhas duas primeiras opções, eram muito reduzidas e a minha média de secundário não era nada de especial (14 valores, na área de Ciências e Tecnologias). Fiquei desiludida por não ter conseguido a primeira opção, ou a segunda pelo menos, e culpei-me porque poderia ter feito melhor no ensino secundário.
AIM - Já tinha tido algum contacto prévio com o mundo da Solicitadoria antes de ingressar no curso?
MS - Nenhum. Desconhecia completamente que portas é que esse curso poderia abrir e como estava o mercado de trabalho nessa área. Acabei por confiar no que a minha irmã mais velha me dizia quanto àquela profissão: que traria certamente mais oportunidades do que uma licenciatura na área social, e na verdade ela tinha razão, pois estou orgulhosa da minha opção.
AIM - Obteve a melhor média no exame final do estágio, ao nível nacional, de 17 valores. Como foi recebida a notícia por si e pela sua família?
MS – Todos sabiam que seria aquele o dia em que seriam publicados os resultados e a curiosidade e os nervos eram constantes. Mas eu sabia que passava, apesar de no primeiro dia de exames, um deles não me ter corrido muito bem (eu achava que não me tinha corrido bem e foi no que obtive melhor nota 18,25 valores). A minha primeira preocupação foi ver a nota da minha companheira de estudos e amiga – Leandra Lopes – pois estava preocupada, e fiquei radiante com o facto de ver a palavra “Aprovado” na lista. Depois é que fui verificar o meu resultado e efectivamente fiquei muito contente, mas só me apercebi que era a melhor nota a nível nacional mais tarde. Analisei as grelhas, vi as notas dos meus colegas da ESTG, fiquei triste por alguns que reprovaram, e então foi aí que verifiquei que realmente tinha sido a melhor. Lá em casa ficaram todos muito contentes e orgulhosos, embora cada um expresse à sua maneira. Acho que a expressão que mais ouvi foi “Não é nada que me surpreenda!”. Eles sabem que sou muito exigente comigo, e acaba por não ser uma surpresa. Não sei se isso é bom ou mau.
AIM - Agora quer terminar o mestrado ao mesmo tempo que trabalha num gabinete de Solicitadoria. Onde trabalha actualmente? Quais são os seus planos futuros?
MS – Não trabalho num gabinete de Solicitadoria. Actualmente trabalho no escritório do Dr. Jorge Canelas, advogado em Pombal, há mais de 20 anos, e que teve um papel muito importante na minha obtenção destes resultados, pois desenvolvi algumas capacidades no contacto com a vida prática, e também alguma astúcia e perspicácia na consulta dos vários códigos. O mestrado trazer-me-á o grau que necessito para atingir um dos meus objectivos futuros: leccionar, numa(s) área(s) do Direito. Pretendo também, a longo prazo, estabelecer-me num escritório com alguns amigos de confiança, que serão certamente excelentes parceiros de trabalho, de modo a criar um gabinete de excelência e seriedade.
AIM - Que conselhos quer deixar a aspirantes a solicitadores?
MS – Batalhem pela melhor média na licenciatura em primeiro lugar. Não se resignem a notas baixas, não pensem em ser iguais a tantos outros, ser a “ovelha negra” nem sempre é mau, aliás, neste contexto fui uma ovelha negra com bastante sucesso. Mas nunca deixem de parte os vossos valores e ideais: não compitam com os colegas, mas convosco; mantenham o espírito de entreajuda e de partilha. Sejam realmente bons profissionalmente mas nunca descurem os valores humanos.
AIM - Quais são os principais ingredientes para se atingir o sucesso?
MS – Para mim sucesso não tem que ver somente com inteligência. É muito mais que isso! O principal ingrediente para o sucesso será, na minha opinião, a exigência! Sermos, em primeiro lugar, exigentes connosco. Claro que à exigência estão associadas outras características como a persistência, a dedicação, o esforço, a paixão e a fé.
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