Fundou os Desbundixie, faz parte da Big Band da Nazaré, é organista em igrejas e é maestro da Sociedade Filarmónica Nossa Senhora da Piedade, em Monte Redondo. Aos 37 anos de idade, o maestro André Venâncio, que já conta com um extenso currículo musical, depara-se com desafios exigentes mas acredita que as bandas filarmónicas estão a ser cada vez mais valorizadas pelo público.
Ana Mendes (AM) - Como e quando surgiu o seu percurso na música?
André Venâncio (AV) - O meu percurso começou com um convite de um amigo meu que me propôs aprender música. O meu pai estava farto de me chatear, mas eu nunca quis. Esse meu colega convidou-me, fui ver como era e comecei a aprender a tocar órgão.
AM - Começou, portanto, com o órgão...
AV - Tinha aulas de órgão electrónico e, um ano e meio depois, surgiu a trompete. Foi então que deixei o órgão. Nessa altura tinha 16 anos.
AM - Onde e porque razão se iniciou na trompete?
AV - Iniciei na filarmónica em Monte Redondo. Comecei com a trompete por engano, porque o que eu queria mesmo era saxofone. O maestro na altura, Gualdino Branco (actual maestro da Filarmónica da Guia), disse-me que 'para a semana me dava o saxofone'. Hoje ainda estou à espera dessa semana.
AM - Outros desafios musicais levaram-no para a direcção de uma banda. Em que altura da sua vida apareceu a batuta?
AV - Antes de ser convidado a vir para a banda, já tinha feito vários cursos de direcção, entre os quais com o maestro Alberto Roque. Foi a convite do antigo presidente da banda, Manuel Oliveira e de Paulo Gomes, actual executante de tuba, que me tornei maestro. Foi pela amizade e por saber das minhas capacidades e da mais-valia que poderia trazer à filarmónica, que me convidaram já há sete anos.
AM - Com quantos músicos conta a filarmónica na actualidade? Quando são ensaios?
AV - 34. Às sextas-feiras das 21h30 às 23h30.
AM - A média de idades dos elementos da filarmónica ronda os 20 anos. Como se lida com pessoas tão jovens e como se dirige um grupo tão heterogéneo de músicos (dos 10 aos 55 anos)?
AV - Eu tento fazer com que o objectivo principal seja sempre a música e cativar os músicos para um reportório mais variado e mais conhecido. Às vezes, deixo até que sejam os músicos a escolherem aquilo que querem tocar.
AM - Quais são os motivos da desmotivação?
AV - Tem um pouco que ver com o aspecto geográfico, devido à centralidade e à variedade de oferta. Os músicos preferem ir a outros lados em vez de irem aos ensaios.
AM - Além de ser, actualmente, a sede da filarmónica, o antigo palacete Dr. Luís Pereira da Costa, abriga, durante a semana e aos fins-de-semana, aulas de música e de dança. A que horas?
AV - Aos sábados a escola e música abre às nove da manhã e fecha às 18 horas. Existem aulas todos os dias da semana, repartidas por vários instrumentos. O edifício tem as valências de filarmónica, escola de música, escola de dança Staccatto, Yoga, Step Ginástica Localizada, Aeróbica, entre outras.
AM - No concelho de Leiria existem 11 filarmónicas. Que futuro para as bandas?
AV - Anteriormente havia o mito da "banda do garrafão". Hoje já não há porque, ao surgirem escolas de música, os executantes começaram a ter outra qualidade e começaram a ser alertados para outra realidade. Puderam ver como, sendo músicos da filarmónica, podem estudar e seguir a via profissional como músico; é só estudar. Antes as pessoas iam à filarmónica só porque gostavam de música, para se divertirem e pelo convívio. Hoje isso ainda acontece, mas o meu papel é fazer a melhor música com as capacidades de cada um.
AM - Como se lida com diferentes níveis musicais?
AV - Motivando para estudar durante a semana, que nem sempre é fácil por causa das actividades profissionais e da escola. Nos ensaios tento trabalhar com os músicos as partes mais complicadas das peças. tento ter em atenção a escolha do reportório pois sei quais são os naipes que estão mais fragilizados.
AM - São conhecidas as rivalidades históricas existentes entre filarmónicas. Tem sentido isso? De que forma?
AV - Não, de forma alguma. Não sinto isso nem faz sentido. Todos nós trabalhamos para o mesmo e ajudamo-nos uns aos outros, tanto maestros como músicos. Se for necessário, posso ir buscar um músico à filarmónica do lado. No entanto, antigamente, era impensável fazer isso. Não havia trocas de músicos.
AM - Além de maestro desta banda, foi fundador do Desbundixie, faz parte da Big Band da Nazaré e é organista na Barosa. Como se encaram papeis musicais tão díspares e complementares entre si?
AV - Para o papel de maestro, todo o estilo de música que se possa executar vai beneficiar a sua formação. Gosto imenso de Jazz e tenho a possibilidade de o puder fazer e ser organista numa igreja possibilita-me aperfeiçoar aspectos ao nível harmónico e não só...
AM - Qual é a sua maior dificuldade como maestro?
AV - É ter os músicos todos no ensaio.
AM - E qual é a maior conquista?
AV - O que é recompensador como maestro é ver o público motivado a ver a banda tocar. Como músico, são os aplausos.
AM - Será que a população rural tem o ouvido educado para apreciar as Bandas Filarmónicas?
AV - Voltamos ao aspecto geográfico... No Norte, qualquer aldeia dá imenso valor às bandas filarmónicas. Quanto mais a Sul, menos filarmónicas existem e menos interesse existe nelas. Leiria é um caso raro; não existem tantas filarmónicas num concelho como no de Leiria.
AM - Até onde quer levar a sua música?
AV - O objectivo principal é levar a minha música a quem a quiser ouvir.
AM - Que conselhos deixa a candidatos a músicos e a maestro?
AV - Aos músicos, muito espírito de sacrifício e muitas horas de trabalho, que vão dar os seus frutos mais tarde. Aos maestros, uma das principais virtudes é a paciência e saber lidar com diversos graus de cultura e faixas etárias; é saber estar com todos ao mesmo tempo.