Na semana passada vi o último episódio de "After Life", uma comédia dramática da plataforma de streaming Netflix. Ao longo de três temporadas e de 18 episódios, o realizador, produtor e protagonista Ricky Gervais, conta como é a vida de "Tony Jonhson", a personagem que "encarna", após a morte da esposa "Lisa" (Kerry Godliman). A primeira temporada estreou em março de 2019 e a última no dia 15 de janeiro deste ano.
"Tony" e o seu cão, o seu fiel amigo |
Em cima da mesa Tony coloca a hipótese de suícidio; afinal, sem a esposa, a sua companheira de todas as horas, a vida perde o significado. Contudo, escolhe encontrar uma alternativa a esta opção e o conforto no melhor amigo Brandy. É o cão de ambos que, desde o dia da morte de Lisa, se torna na razão pela qual Tony acorda diariamente. Além disso, ao escolher dizer e fazer o que lhe der na cabeça, Tony descarrega os sentimentos de impotência, de frustração e de tristeza deixados pela perda da esposa, no humor negro com que se dirige aos outros.
Os dias de Tony são todos muito parecidos e rotineiro: acorda; vê uns vídeos engraçados da esposa Lisa no computador; dá o pequeno almoço ao cão; veste-se para ir trabalhar; vai trabalhar no jornal local londrino "Tambury Gazette"; faz o seu trabalho, onde conta histórias caricatas de pessoas que fazem tudo para aparecer no jornal; vai visitar o pai ao lar (quando este ainda está vivo e com a doença de Alzheimer); visita a campa da falecida esposa, onde conhece uma senhora que se encontra numa situação parecida e de quem se vai tornando amigo, a Anne (Penelope Wilton); regressa a casa e vê, outra vez, alguns videos da falecida esposa. Com poucas variações, os dias do protagonista desta série, desenrolam-se entre recordações, alegrias, tristezas e, acima de tudo, vazio e saudade.
Esta série dramática mostra, de uma forma mais ou menos leve, mais ou menos irónica, mais ou menos realista, como é viver o luto de uma morte anunciada. Digo "anunciada" pois o cancro, de uma forma lenta e silenciosa, foi destruindo aos poucos a vida de "Lisa" (que apenas aparece viva nos vídeos e na memória de Tony). O derradeiro fim seria inevitável. "Tony" via na esposa o ombro amigo de todas as horas, a companheira de vida inseparável, o grande amor que o cancro, injustamente, levou.
Tony teve de aprender a lidar com a perda, com o sentimento de impotência por nada poder fazer para trocar as voltas ao inevitável destino, e com a dor do luto. Teve, no final de contas, de reaprender a viver sem a sua mais-que-tudo. Tinha ajuda psicológica, refugiava-se no trabalho e nas conversas leves com uma das funcionárias da casa de repouso onde estava o pai, Emma (Ashley Jensen), de quem acabou por se tornar amigo.
O último episódio da terceira season foi, sem dúvida, o que mais me marcou precisamente devido a um momento muito específico, em que Tony e o colega se deslocam a um hospital infantil oncológico. Aí, uma das crianças com quem Tony fala e que sofre com cancro, diz-lhe que se chama "Lisa". O nome, portanto, da mulher de Tony. Quando questionado sobre o local onde ela está, Tony diz à menina que ela está em casa. Nesse momento, admito, não consegui conter a lágrima. Eu sou assim, emocional.
Esta foi, sem dúvida, a melhor série que já vi. Não uma das melhores, reforço, A MELHOR. Comecei a vê-la numa altura da vida em que achava que estava feliz, mas terminei-a numa altura em que estou realmente feliz. Tal como o Tony, eu já tive de fazer o luto de pessoas que faleceram. Doeu e não foi pouco. Também já tive de fazer o luto indesejado e negro de pessoas vivas que já não estão na minha vida, mas que continuam vivas. E qual deles será o pior? - A resposta a esta pergunta reside em cada um de nós porque cada caso é um caso e cada um vive a sua realidade à luz da cultura, as crenças, da educação e das próprias experiências de vida que vai tendo.