Dotar os refugiados de conhecimentos de português que lhes
facultem um acesso mais facilitado ao mercado do trabalho cá é o objectivo da
formação que decorre até Março no Centro de Formação Profissional de Alverca.
Alpha Barry tem 22 anos, era professor de Química quando
teve que fugir da Guiné-Conacri. Sonha com uma actividade relacionada com a sua
área mas o primeiro passo tem mesmo que ser a aprendizagem da língua. “O meu
sonho é saber falar bem a língua”, diz com um sorriso nos olhos. É um dos cerca
de 30 alunos que escutam atentamente a formadora na sua primeira aula de
português no Centro de Formação Profissional de Alverca.
Estes são refugiados esperançosos de que as aulas de
português lhes possam facultar um acesso mais facilitado ao mundo do trabalho.
Alpha diz apenas que fugiu devido “aos problemas políticos no [meu]
país”. Nota-se que não se quer alongar em mais explicações mas o estatuto de
refugiado só é dado a pessoas que no seu país são “ perseguidas em virtude da
sua raça, religião, nacionalidade, filiação em certo grupo social ou das suas
opiniões políticas”, de acordo com a Convenção de Genebra de 1951, relativa ao
Estatuto de Refugiado.
“São pessoas que têm dificuldades na compreensão da Língua
Portuguesa, e a formação tem como objectivo ajudá-los a ultrapassar as
dificuldades no português, durante as suas rotinas diárias”, afirma Sofia
Ferreira, a única formadora do Instituto de Emprego e Formação Profissional de
Alverca (IEFP). Apesar das dificuldades encontradas por algumas pessoas, a
formadora, considera que “vontade não lhes falta”, que as pessoas estão
motivadas e são “muito pontuais”.
A formação é obrigatória para a manutenção do Rendimento
Social de Inserção. No caso de os refugiados faltarem o subsídio é suspenso.
Acerca desta temática, Susana Marques, Directora de Serviços de Emprego e
Formação Profissional da Delegação da Região de Lisboa e Vale do Tejo refere
que “este trabalho não foi desenvolvido para testar a sua aceitação da formação
profissional. É uma prática que decorre das obrigações dos candidatos enquanto
perceptores de apoio social”, tratando-se somente de um processo burocrático
aplicado também por outras instituições.
O acordo celebrado entre o Instituto da Segurança Social, o
Conselho Português para os Refugiados, o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras,
o Instituto de Emprego e Formação Profissional, o Alto Comissariado Para a
Imigração e Diálogo Intercultural e a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa
destina-se a abranger todos os refugiados e requerentes de protecção
internacional titulares de autorização de residência, independentemente do ano
da sua chegada a Portugal.
A formadora acredita que este género de programas tem uma
importância acrescida, porque, para além da vantagem que os alunos têm em
aprender a língua portuguesa são recebidos por alguém que os apoia. “Nós quando
vamos para um país geralmente temos um amigo, alguém que conhecemos para nos
receber e ajudar-nos. Eles não têm e precisam. Nós damos-lhes ferramentas para
isso”, exemplifica com um brilho nos olhos.
Bambo Drame tem 18 anos e, tal como Alpha Barry, vem da
Guiné-Conacri, onde a língua que usava no dia-a-dia era o francês. Apesar de
reconhecer a dificuldade em aprender a língua portuguesa, acredita que no nosso
país lhe pode oferecer “melhores condições de vida”. Quer aprender a nossa
língua para trabalhar na agricultura. Sabe que se aprender bem o português,
“vai ser mais fácil” entrar no mercado de trabalho.
Gabriela Granito, técnica do IEFP e coordenadora da acção,
sublinha a importância da aprendizagem da língua materna do país para facilitar
a construção de um “projecto de vida.” O objectivo desta formação é “dar
condições para que eles aprendam bem numa acção de ‘Português para Todos’ para que
tenham uma aprendizagem do português e que possam integrar-se bem na nossa
sociedade”, refere.
O PPT tem como objectivo facultar um
conjunto de conhecimentos indispensáveis a uma inserção de pleno direito na
sociedade portuguesa à população imigrante. Pretende promover a capacidade de
expressão e de compreensão da língua portuguesa e o conhecimento dos direitos
básicos de cidadania, entendidos como componentes essenciais a um processo de
integração adequado, com um conjunto de acções de formação em língua
portuguesa.
Esta formação teve uma duração de 150 horas ao longo das
quais foram abordados seis tópicos distintos, cada um com 25 horas. Foram eles,
“eu e a minha rotina diária”, “hábitos alimentares, cultura e lazer”, “o corpo
humano, saúde e serviços”, “eu e o mundo do trabalho”, “o meu passado e o meu
presente”, “comunicação e vida em sociedade”.
Susana Marques, directora de Serviços de Emprego e Formação
Profissional da Delegação da Região de Lisboa e Vale do Tejo, diz que “neste
caso, estas pessoas foram sinalizadas para cursos de português mas há quem seja
encaminhado para medidas activas de emprego [porque já dominam a língua] ”.
Está prevista a extensão do programa a dois Centros de Emprego e de Formação
Profissional em Lisboa, dependendo do número de candidatos que forem
sinalizados.
“A aula está a decorrer muito bem” revela Sofia Ferreira
acerca do primeiro dia de formação. “Eles estão muito motivados porque querem
aprender”, ressalva a formadora. Exemplo de entusiasmo é Salifou Sylla, guineense
de 19 anos. “Quero trabalhar na área da carpintaria ou da agricultura”, diz,
com algumas dificuldades em se expressar, mas com entusiasmo. Para ele, o
português é uma língua “fácil de aprender”.
O objectivo é que, no final, “eles [os formandos] estejam aptos
a conseguirem preencher um documento e a fazer uma leitura de um horário. Estas
são actividades que são simples para os nativos da língua, mas para eles é
complicado”, sublinha a formadora.
Além das aulas de língua portuguesa, as medidas de inserção
dos refugiados incluem “a participação em programas de ocupação ou outros de
carácter temporário, a tempo parcial ou completo, que favoreçam a inserção no
mercado de trabalho ou prossigam objectivos socialmente necessários ou úteis
para a comunidade”, explica Joana Matos do Instituto de Segurança Social. Este
género de formações surgiu de uma “rede alargada de instituições para o
acolhimento e a integração de refugiados com o objectivo de diminuir a exclusão
social e promover a integração e o bom acolhimento da população em Portugal”.
A Guiné-Conacri, o Afeganistão, a Colômbia, a Somália, a
Etiópia, o Congo, a Eriteia, o Irão, a Líbia, a Rússia, a Bósnia, a
Bielorrússia, a Roménia e a Sri Lanka e a Arménia encontram-se entre os 15
países que o programa abrange. Os refugiados que são contemplados pelo curso
que se vai prolongar até ao dia 26 de Março vivem, maioritariamente, nos
arredores de Lisboa.
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