segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

Refugiados realizam sonho de aprender em português



Dotar os refugiados de conhecimentos de português que lhes facultem um acesso mais facilitado ao mercado do trabalho cá é o objectivo da formação que decorre até Março no Centro de Formação Profissional de Alverca.


Alpha Barry tem 22 anos, era professor de Química quando teve que fugir da Guiné-Conacri. Sonha com uma actividade relacionada com a sua área mas o primeiro passo tem mesmo que ser a aprendizagem da língua. “O meu sonho é saber falar bem a língua”, diz com um sorriso nos olhos. É um dos cerca de 30 alunos que escutam atentamente a formadora na sua primeira aula de português no Centro de Formação Profissional de Alverca. 


Estes são refugiados esperançosos de que as aulas de português lhes possam facultar um acesso mais facilitado ao mundo do trabalho. Alpha diz apenas que fugiu devido “aos problemas políticos no [meu] país”. Nota-se que não se quer alongar em mais explicações mas o estatuto de refugiado só é dado a pessoas que no seu país são “ perseguidas em virtude da sua raça, religião, nacionalidade, filiação em certo grupo social ou das suas opiniões políticas”, de acordo com a Convenção de Genebra de 1951, relativa ao Estatuto de Refugiado.

“São pessoas que têm dificuldades na compreensão da Língua Portuguesa, e a formação tem como objectivo ajudá-los a ultrapassar as dificuldades no português, durante as suas rotinas diárias”, afirma Sofia Ferreira, a única formadora do Instituto de Emprego e Formação Profissional de Alverca (IEFP). Apesar das dificuldades encontradas por algumas pessoas, a formadora, considera que “vontade não lhes falta”, que as pessoas estão motivadas e são “muito pontuais”.


A formação é obrigatória para a manutenção do Rendimento Social de Inserção. No caso de os refugiados faltarem o subsídio é suspenso. Acerca desta temática, Susana Marques, Directora de Serviços de Emprego e Formação Profissional da Delegação da Região de Lisboa e Vale do Tejo refere que “este trabalho não foi desenvolvido para testar a sua aceitação da formação profissional. É uma prática que decorre das obrigações dos candidatos enquanto perceptores de apoio social”, tratando-se somente de um processo burocrático aplicado também por outras instituições. 


O acordo celebrado entre o Instituto da Segurança Social, o Conselho Português para os Refugiados, o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, o Instituto de Emprego e Formação Profissional, o Alto Comissariado Para a Imigração e Diálogo Intercultural e a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa destina-se a abranger todos os refugiados e requerentes de protecção internacional titulares de autorização de residência, independentemente do ano da sua chegada a Portugal.


A formadora acredita que este género de programas tem uma importância acrescida, porque, para além da vantagem que os alunos têm em aprender a língua portuguesa são recebidos por alguém que os apoia. “Nós quando vamos para um país geralmente temos um amigo, alguém que conhecemos para nos receber e ajudar-nos. Eles não têm e precisam. Nós damos-lhes ferramentas para isso”, exemplifica com um brilho nos olhos.


Bambo Drame tem 18 anos e, tal como Alpha Barry, vem da Guiné-Conacri, onde a língua que usava no dia-a-dia era o francês. Apesar de reconhecer a dificuldade em aprender a língua portuguesa, acredita que no nosso país lhe pode oferecer “melhores condições de vida”. Quer aprender a nossa língua para trabalhar na agricultura. Sabe que se aprender bem o português, “vai ser mais fácil” entrar no mercado de trabalho. 


Gabriela Granito, técnica do IEFP e coordenadora da acção, sublinha a importância da aprendizagem da língua materna do país para facilitar a construção de um “projecto de vida.” O objectivo desta formação é “dar condições para que eles aprendam bem numa acção de ‘Português para Todos’ para que tenham uma aprendizagem do português e que possam integrar-se bem na nossa sociedade”, refere. 


O PPT tem como objectivo facultar um conjunto de conhecimentos indispensáveis a uma inserção de pleno direito na sociedade portuguesa à população imigrante. Pretende promover a capacidade de expressão e de compreensão da língua portuguesa e o conhecimento dos direitos básicos de cidadania, entendidos como componentes essenciais a um processo de integração adequado, com um conjunto de acções de formação em língua portuguesa. 


Esta formação teve uma duração de 150 horas ao longo das quais foram abordados seis tópicos distintos, cada um com 25 horas. Foram eles, “eu e a minha rotina diária”, “hábitos alimentares, cultura e lazer”, “o corpo humano, saúde e serviços”, “eu e o mundo do trabalho”, “o meu passado e o meu presente”, “comunicação e vida em sociedade”. 


Susana Marques, directora de Serviços de Emprego e Formação Profissional da Delegação da Região de Lisboa e Vale do Tejo, diz que “neste caso, estas pessoas foram sinalizadas para cursos de português mas há quem seja encaminhado para medidas activas de emprego [porque já dominam a língua] ”. Está prevista a extensão do programa a dois Centros de Emprego e de Formação Profissional em Lisboa, dependendo do número de candidatos que forem sinalizados.


“A aula está a decorrer muito bem” revela Sofia Ferreira acerca do primeiro dia de formação. “Eles estão muito motivados porque querem aprender”, ressalva a formadora. Exemplo de entusiasmo é Salifou Sylla, guineense de 19 anos. “Quero trabalhar na área da carpintaria ou da agricultura”, diz, com algumas dificuldades em se expressar, mas com entusiasmo. Para ele, o português é uma língua “fácil de aprender”.


O objectivo é que, no final, “eles [os formandos] estejam aptos a conseguirem preencher um documento e a fazer uma leitura de um horário. Estas são actividades que são simples para os nativos da língua, mas para eles é complicado”, sublinha a formadora. 


Além das aulas de língua portuguesa, as medidas de inserção dos refugiados incluem “a participação em programas de ocupação ou outros de carácter temporário, a tempo parcial ou completo, que favoreçam a inserção no mercado de trabalho ou prossigam objectivos socialmente necessários ou úteis para a comunidade”, explica Joana Matos do Instituto de Segurança Social. Este género de formações surgiu de uma “rede alargada de instituições para o acolhimento e a integração de refugiados com o objectivo de diminuir a exclusão social e promover a integração e o bom acolhimento da população em Portugal”.


A Guiné-Conacri, o Afeganistão, a Colômbia, a Somália, a Etiópia, o Congo, a Eriteia, o Irão, a Líbia, a Rússia, a Bósnia, a Bielorrússia, a Roménia e a Sri Lanka e a Arménia encontram-se entre os 15 países que o programa abrange. Os refugiados que são contemplados pelo curso que se vai prolongar até ao dia 26 de Março vivem, maioritariamente, nos arredores de Lisboa.

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