quinta-feira, 1 de março de 2018

A perspetiva de quem visita o país estrangeiro que me acolheu


Resido e trabalho há um ano e um mês em Moçambique. Há uma semana recebi em minha casa uma amiga portuguesa que, atualmente, trabalha na Holanda. E é engraçado ver noutra pessoa, ouvir de outra pessoa e sentir de outra pessoa aquilo que, há um ano, quando aterrei, eu vi, eu ouvi e eu senti.


Escolhi trabalhar na Escola Portuguesa de Moçambique por um ano. Um ano que agora caminha para um ano e meio. Além de visitar mais e de desbravar novos horizontes antes para mim desconhecidos, posso receber uma ou outra visita de alguém que vem só visitar e conhecer um outro mundo, uma nova realidade.

“Pérola do Índico”, como é nomeado por muitos, Moçambique é um país de contrastes. Apercebeu-se disso a minha amiga Diva assim que a levei a ver o pôr do sol mais bonito da cidade: “Como é que numa mesma cidade coexistem locais tão bonitos e lixo no chão?”, questionou.

Sabe hoje, a Diva, que antes de aterrar é essencial virmos sem ideias pré-concebidas, sem opiniões feitas nem preconceitos. Só uma mente limpa, livre e aberta consegue absorver e aproveitar o que um outro país, os nativos dessa zona e uma nova cultura têm para oferecer e ensinar.

“Está tanto calor, estou sempre a soar!”, diz-me a Diva, quase todos os dias. “As mangas e as papaias têm um sabor maravilhoso”, comenta. “É impressionante comer tão bem por preços tão ridículos”, impressiona-se com a diferença diariamente. “E as praias!? Ah, essas são lindas de cortar a respiração!”, exclama.

Há um ano era eu neste espanto, nesta admiração. Agora é-o outra pessoa que nunca tinha saído da Europa e para quem, todos os dias, são uma surpresa. É interessante ver num outro alguém aquilo que eu já fui. Já estive perdida. Já senti que aqui não pertencia. Já questionei inúmeras vezes o porquê de estar cá. Ainda não encontrei resposta para muitas das minhas interrogações.

Agora vejo-o numa outra pessoa. Sinto-o numa outra pessoa. “Ana, todos olham para mim. Sinto-me como um negro se sente em Portugal”, diz-me a Diva com espanto no olhar. Está na pele do outro e sente-o todos os dias, a todas as horas, tal como eu já o senti e o sinto ainda.

Afinal, só quando vestimos a pele do outro é que fazemos ideia de como o outro se sente, quando o julgamento alheio emerge de todos os lados, só por ter outra cor de pele. E sentimo-lo, todos os dias. Somos brancos num país de pretos. São pretos num país de brancos. Falamos a mesma língua. Mas tudo o resto é diferente: os locais, a cultura, os hábitos, a gastronomia, os trajes, os pores do sol e o humor.

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